excrescência
2 fig. demasia, excesso, superfluidade; coisa que desequilibra a harmonia de um todo
Uma excrescência. Assim dá para definir a entrada do Brasil no Mundial masculino de basquete, por meio de convite da Fiba. O motivo para abominar o que rolou tem um preço: 820 mil euros, ou, se preferir, R$ 2,665 milhões.
A Fiba está na dela, assim qualquer loja no shopping ou restaurante ou o que você preferir. Coloca-se na prateleira o produto wild card com o preço que quer, no caso, R$ 2,665 milhões. Para entrar na fila, leia-se, entrar na fila, sem a segurança de que o produto será comprado, as entidades tinham que desembolsar essa fortuna. Eu coloco o preço, se alguém quiser pagar, ótimo. Trouxa não é quem cobra, trouxa é quem paga.
Pois bem, 13 países entraram na fila. Alemanha e Itália tiveram sanidade suficiente para pedir licença e dar uma voltinha. Para a Fiba, danem-se alemães, italianos, brasileiros, enfim, dane-se quem entrou, quanto mais gente nessa fila, melhor. Afinal, receber R$ 34,6 milhões sem sair do lugar é o sonho de consumo de qualquer um, certo?
Brasil, Grécia, Turquia e Finlândia foram os escolhidos. Brasil, com um basquete falido, um campeonato nacional que ninguém sabe quando acontece ou quem joga, sem perspectiva alguma de um futuro primissor, torra dinheiro sabe-se lá de quem – de onde vem? – para conseguir a vaga. Depois do papelão na Copa América, aquela que garantia o país esportivamente, o que pensa a entidade em disputar um Mundial, com um nível técnico extremamente superior ao torneio continental? Espera-se um título? Sério?
E mesmo se o Brasil fosse uma gigantesca potência, será que vale a pena fritar essa grana dessa maneira? Se a ideia é fomentar o esporte, que já foi um dos mais praticados e queridos do país, não seria melhor investir na base? Quantos torneios se paga com essa grana? Quantos jogadores se formam com essa fortuna? São tantas as perguntas que nem vale a pena continuar.
O wild card existe, e só isso já é uma bizarrice. Imagine que seu time de futebol foi rebaixado, não jogou nada, levou nabo de deus e o mundo, mas, sabe como é, já ganhou o campeonato duas vezes, então, amigão, paga uma grana aí e joga na elite, vai. A gente gosta de você, quer dizer, pagando, a gente te ama. É bizarro um Mundial com seleções convidadas, quando acho que o critério técnico sempre deve prevalecer. Ficar fora de um Mundial por falta de qualidade é um demérito, mas se classificar por um critério financeiro e lobista é tão abominável quanto torrar a grana para entrar na fila. O wild card, repito, é uma bizarrice.
Para completar, uma coincidência história marca a data. Em um 31 de janeiro de 1959, há 55 anos, o Brasil conquistava o primeiro de seus dois títulos mundiais, destruindo o dono da casa Chile no jogo derradeiro por 73 a 49. A seleção figurou entre os quatro mais bem colocados nas seis primeiras edições do torneio: 4ª em 1950, 3ª em 1967, vice em 1954 e 1970 e campeã em 1959 e 1963, a primeira bicampeã da história. Mais uma pergunta, para finalizar: será que esse sucesso sem precedentes – nem antecedentes – custou algo perto de R$ 2,665 milhões?
Fica, aqui, a admiração e a homenagem a Amaury Antônio Pasos, Carmo de Souza “Rosa Branca”, Edson Bispo dos Santos, Fernando Pereira de Freitas, Jathyr Eduardo Schall, José Maciel Senra “Zezinho”, Otto Carlos Phol da Nóbrega, Pedro Vicente Fonseca “Pecente”, Waldemar Blatkauskas, Waldyr Geraldo Boccardo, Wlamir Marques e Zenny de Azevedo “Algodão”, além do técnico Togo Renan Soares “Kanela” e do assistente João Francisco Braz, responsáveis, dentro de quadra, pelo primeiro título mundial do Brasil. Há 55 anos, o país precisava apenas de uma bola, muita técnica e doses cavalares de raça para brilhar. Hoje, 55 anos e um dia depois, precisa abrir a carteira para entrar na fila e trabalhar nos bastidores para receber uma pulseirinha VIP e entrar em um Mundial. Uma pena. Uma excrescência.
P.S.: A escolha do Brasil está explicada aqui, no site da Fiba, em inglês, entenda como quiser.